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Primeira retificação extrajudicial de prenome e gênero no registro civil de pessoa transexual no Estado é realizada mediante...

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Primeira retificação extrajudicial de prenome e gênero no registro civil de pessoa transexual no Estado é realizada mediante a - Foto: Nicole Carvalho / Ascom DPERS

Porto Alegre (RS) - “O documento representa a minha vida, representa quem eu sou”. Com lágrimas nos olhos, sorriso largo no rosto e expressão de alívio, a analista e desenvolvedora de sistemas Evelyn Mendes, a primeira transexual no Estado a conseguir retificar o registro civil após a decisão do STF que permite fazê-lo sem ação judicial, comenta que foi muito fácil e elogiou o processo do início ao fim. “As pessoas foram tão solícitas, tão legais, algo que não estou acostumada. Tive aceitação. Me deu muita força, me passaram muita confiança”, revela. O procedimento administrativo de retificação teve início mediante encaminhamento de ofício pelo Núcleo de Defesa dos Direitos Humanos da Defensoria Pública (NUDDH-DPERS) e foi efetivado pelo Cartório de Registro Civil de Pessoas Naturais da 5ª Zona de Porto Alegre.

“A decisão do STF foi um avanço e sempre foi a posição da Defensoria Pública, especialmente a do CRDH. Lutamos pela efetivação desse direito de identidade para que passe a constar o verdadeiro nome e gênero que a pessoa se identifica. A partir dessa decisão, traçamos uma estratégia de atuação para obter êxito”, pontuou o Defensor Público Dirigente do Núcleo de Defesa dos Direitos Humanos e Coordenador do CRDH, Mário Rheingantz.

O Cartório da 5ª Zona, em Porto Alegre, que foi o primeiro do Estado a oficializar essa ação extrajudicial, entendeu a decisão do STF como já aplicável. “O meu sentimento após atender a Evelyn foi o de dever cumprido. Me senti confortável por ter sido um braço do Estado a proporcionar cidadania à Evelyn. Cumpre afirmar que quando da retificação, antecedida por entrevista com a requerente, houve momentos que mexeram com nosso emocional. Acredito que foi um "marco" para a história do Registro Civil das Pessoas Naturais do Rio Grande do Sul e até a nível nacional. Ao fim e ao cabo, o momento significou a certeza de que o RCPN é, efetivamente, o órgão que pratica a cidadania”, afirmou o Oficial do Registro Civil das Pessoas Naturais da 5ª Zona de POA, Arioste Schnorr.

Com os documentos em mãos, Evelyn confessa que não passará mais por situações constrangedoras, como em viagens, banco, utilização de sistemas de saúde, entre outros locais. Mesmo com a carteirinha do nome social há cerca de 18 meses, ela conta que passou por embaraços, pois nem sempre as pessoas e estabelecimentos estão preparados para recebê-la. “Já recusei viagens por causa disso, sabia que ia ser um stress. No dia a dia, eu me sentia num limbo sem os documentos. Agora, com o registro, me dá segurança, liberdade. Não preciso me preocupar com nada, vai ser natural, não vai ter ansiedade, nem medo”, desabafa. Evelyn sempre buscou ter uma postura firme diante de situações constrangedoras. “Isso ajuda outras que possam passar pela mesma situação e que estejam em momento de fragilidade da vida. Sempre mantive essa forma mais aguerrida em situações como essas”, disse.

Decisão do STF

A partir da decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) do dia 1º de março, na Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 4275, pessoas transexuais e travestis têm o direito de alterar nomes e sexo no registro civil sem a necessidade de realizar cirurgia de redesignação sexual ou de apresentar laudo médico pericial. Os processos de retificação do registro civil poderão ocorrer por via administrativa, sem a necessidade de judicialização no cartório que há registro civil de nascimento. Apesar de a decisão não definir data para os cartórios iniciarem o procedimento, já pode ser cumprida a decisão. “O critério é a autodeclaração. O que determina se a pessoa se identifica ou não com aquele gênero, aquele nome é uma questão interna, psicológica, subjetiva. É a própria pessoa que se sente identificada com aquele gênero e com aquele nome. Há pouco tempo se enfrentava resistência e havia inclusive juízes que exigiam perícia psiquiátrica”, relembrou Mário.

Como funciona

As pessoas transexuais que desejam a retificação do registro civil para que conste o nome com o qual se identificam podem fazê-lo sem ação judicial, diretamente no Cartório de Registro Civil. Como o STF ainda não definiu datas para os cartórios iniciarem os processos, a categoria está dividida, conforme relata Arioste. “A posição majoritária vai no sentido de que dependemos de um provimento do Conselho Nacional de Justiça especificando critérios, tais como documentos, certidões etc. No entanto, o signatário alinha-se ao raciocínio da minoria, ou seja, a decisão do STF é autoaplicável e os critérios devem ser analisados caso a caso, até porque nenhuma situação será similar. Deve o registrador agir com prudência. Não havendo dúvida, impõe-se o deferimento do pleito. Havendo dúvida, deve suscitá-la às autoridades competentes (Juiz Diretor do Foro da Comarca e Juiz de Direito da Vara dos Registros Públicos). O impacto na sociedade deve soar positivamente. É importante que as pessoas identifiquem-se documentalmente exatamente nos termos em que realmente elas se definem. Essa primeira alteração certamente incentivará outras pessoas a agirem da mesma forma, fazer valer os seus direitos. Se o STF sentenciou, e ao meu ver, corretamente, de que é possível a alteração, não restam dúvidas de que nós, registradores, devemos cumprir a decisão, sempre com muita cautela”, declarou o oficial.

Para que haja efetividade do direito e obtenção de êxito na demanda, o Núcleo de Defesa dos Direitos Humanos da Defensoria Pública (NUDDH-DPERS) passou a enviar um ofício com fundamentação jurídica aos cartórios, a fim de solicitar o cumprimento da decisão do STF. “A decisão tem eficácia para todas as pessoas e é obrigatória, tem que ser cumprida por todos os órgãos da Administração Pública, e os Cartórios são órgãos da administração. O ofício traz segurança jurídica, inclusive para o Cartório”, alegou Mário. O Defensor Público orienta que as pessoas procurem a Defensoria Pública em qualquer comarca do Estado para o(a) Defensor(a) realizar o encaminhamento do ofício. “Nada impede que a pessoa possa ir sozinha ao cartório, contudo, é importante que ela venha ao CRDH, pois enviaremos ofício expondo a fundamentação jurídica, o que auxilia no êxito da demanda”, finalizou.

 

Texto: Nicole Carvalho /Ascom DPERS
Defensoria Pública do RS
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